segunda-feira, 14 de abril de 2014

Sampa

O baiano Caetano Veloso, com “Sampa”, revela a cidade feia e bonita ao mesmo tempo. O susto de quem chega. A deselegância. O privilégio de ser o lugar de Rita Lee. A poesia concreta. E a gente diversa. Os novos baianos, africanos, italianos, cearenses, cariocas, interioranos... Caetano morou num edifício na rua São Luís, perto da Praça da República e da esquina que virou mito por causa de sua canção: a que une as ruas Ipiranga e São João. “Sampa” fala sobre esse período em que o Centro de São Paulo foi tropicalista. O baiano se inspirou na cidade e vice-versa. Fez também uma homenagem a Paulo Vanzolini ao usar uma frase melódica de “Ronda” no último trecho de sua “Sampa”. O compositor e zoólogo foi outro grande tradutor de São Paulo e sua boêmia. Uma das mais recentes caminhadas noturnas promovida pelo grupo que não desiste de revitalizar o centrão de São Paulo teve como tema esses encontros: a Ipiranga com a São João, Caetano e Vanzolini, a gente de toda parte com a São Paulo dura, nua, crua e muito bela. É só olhar e se entregar. Essa cidade é sedutora. O projeto Caminhada Noturna foi idealizado por Carlos Beutel, dono de restaurante vegetariano e militante pela recuperação do Centro. Os passeios são realizados nas quintas-feiras, a partir das 20h. O encontro é sempre na frente do Teatro Municipal, cenário que por si só é uma grande atração. A pé, grupos de 50 a 100 pessoas percorrem trajetos no Centro e recebem informações históricas e arquitetônicas. As noites sempre terminam em pizza, em outro lugar que é a cara de São Paulo: um dos vários restaurantes localizados no térreo do Edifício Copan. Logo de cara, Beutel e seus parceiros dão o recado: não é tão perigoso assim caminhar pelas ruas. Ninguém precisa passar a vida circulando apenas em shoppings. Ninguém merece. A violência existe, é óbvio. Mas não é catastrófica como querem nos fazer acreditar. Dá para caminhar em grupo pelo centrão de São Paulo sem medo de ser feliz. A caminhada sempre tem especialistas convidados para falar o que sabem sobre os pontos visitados. Uma das informações: a Ipiranga com a São João é alvo de um processo de tombamento como patrimônio imaterial de São Paulo. A música de Caetano fez o local virar um símbolo eterno. Beutel e outros defensores da preservação do Centro acham que falta algo a mais ali. Uma estátua de Caetano, quem sabe? Como faz o Rio com seus personagens marcantes. Acho que não falta é nada. A arquitetura da região central, a história da urbanização da região, a música e o Bar Brahma, localizado na famosa esquina, já bastam para atrair moradores e turistas interessados em conhecer melhor a cidade. Com shows de nomes como Cauby Peixoto e Ângela Maria, o Bar Brahma faz sua parte para manter o Centro vivo. O grupo da caminhada noturna também. Dezenas de sem-teto dormindo nas ruas e sujeira espalhada por todos cantos nos lembram o tempo todo que ainda falta muito. O que não dá é para desistir no meio do trajeto. As belas fotos são de Su Stathopoulos

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