quinta-feira, 6 de março de 2014

Uma pérola no Centro de São Paulo

Amplo e confortável, o Novotel Jaraguá, no Centro de São Paulo (rua Martins Fontes, 71), tem outro atrativo sedutor para quem gosta de aproveitar as viagens para conhecer histórias. Inaugurado em 1954, já hospedou artistas, empresários e políticos nas décadas passadas. Até Fidel Castro passou por lá. Fotos no saguão e nos corredores do prédio contam essa trajetória pra lá de interessante. Sim, dá um gostinho especial ficar no mesmo local que já abrigou, além do líder cubano, o ator Marlon Brando, a cantora Edith Piaf, a rainha Elizabeth e Yuri Gagarin, o primeiro cosmonauta. O prédio é um exemplar da arquitetura modernista paulistana. No passado, foi sede do jornal "O Estado de S. Paulo" e de uma emissora de rádio do grupo, além do antigo Hotel Jaraguá. O projeto inicial é de Jacques Pilon, arquiteto francês que foi um dos responsáveis pela arquitetura brasileira modernista. De acordo com o artigo "Um ícone reaproveitado: o Hotel Jaraguá em São Paulo", dos arquitetos e urbanistas Carmen Alvarez e Candido Malta Campos, o Jaraguá foi inaugurado no IV Centenário de São Paulo e, por causa de sua localização estratégica, tornou-se um dos símbolos da modernidade na capital. Decadente na década de 1990, foi desativado. O tombamento pelo Condephaat garantiu a preservação de sua volumetria, fachada, murais e pinturas. Depois, uma reforma interna e o arrendamento para uma rede hoteleira permitiram a utilização do prédio com bastante conforto para os hóspedes atuais. O hotel é quatro estrelas, o que significa preços salgados nos dias de maior movimento. A dica para quem quer conhecer é ficar de olho nas ofertas comuns nos finais de semana sem grandes eventos em São Paulo. Além da arquitetura modernista e de um grande relógio localizado no topo e famoso nas décadas passadas, o prédio tem painéis de Di Cavalcanti (na parte externa) e Clóvis Graciano (interna). Um luxo. A prometida revitalização da região central caminha a passos lentos. Não é agradável perceber o abandono e a sujeira nas ruas. A miséria humana está em cada esquina. Apesar disso, o charme arquitetônico e histórico permanece. Ao contrário do que dizem seus difamadores, São Paulo tem sim sua beleza. Outra vantagem de escolher a região para se hospedar é o acesso fácil a uma infinidade de bares, restaurantes e estabelecimentos comerciais. Ficam na vizinhança, por exemplo, os restaurantes da famosa Famiglia Mancini, na rua Avanhandava, essa sim totalmente revitalizada pelo proprietário do grupo, Walter Mancini. "Apesar de estar no ramo de restaurantes, observo as praças, as avenidas, a arquitetura. Os restaurantes podem desaparecer um dia, mas as ruas sempre permanecem. É por elas que as pessoas transitam com seus sonhos, suas ideias e sua esperança. E elas sempre nos levam a outro lugar", ele diz. É caro comer e beber num dos restaurantes. Mas vale a pena, pelo menos uma vez na vida. Não apenas pela qualidade do que é servido e pelo atendimento cuidadoso, mas também pelo ambiente bastante agradável. Fontes e lâmpadas coloridas dão ar de festa à Avanhandava. Mancini acertou ao bancar o embelezamento de sua rua. Outro vizinho famoso é o Estadão Lanches, que fica aberto 24 horas e onde é servido o sanduíche de pernil conhecido por ser o mais saboroso de São Paulo. É um ponto de encontro boêmio há quatro décadas. A Praça da República, o também histórico Edifício Copan e a deliciosa Praça Roosevelt ficam nos arredores. A Roosevelt, cheia de bares e teatros, faz parte da resistência à degradação do Centro. Circular por ali é garantia de encontrar artistas, prontos para se apresentar ou para assistir os colegas nos palcos. Ainda na região (Nestor Pestana, 125), uma tristeza: os escombros do Teatro Cultura Artística, vítima de um incêndio em 2008 e até hoje não recuperado. Por sorte, um grande afresco de Di Cavalcanti sobreviveu às chamas. É um lugar cheio de memórias artísticas. Grandes nomes do teatro como Cacilda Becker, Sérgio Cardoso, Paulo Autran, Tônia Carrero, Dercy Gonçalves, Antônio Fagundes e Bibi Ferreira já passaram por seu palco. Do lado de fora, outra figura era cativa até a fase final da vida: Plínio Marcos, conhecido por retratar o submundo em suas peças. O Cultura Artística era o lugar preferido de Plínio para vender suas obras, impressas de forma artesanal. Um restaurante na Avanhandava, o lendário Gigetto, oferecia ao dramaturgo as refeições diárias. Alguns dos garçons de antigamente ainda estão lá para contar essa e outras histórias.

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